Queria começar este artigo por contar um episódio casual, ao qual tive o privilégio de assistir; durante as festas de uma das freguesias do Seixal, um senhor dirigiu-se à equipa municipal de apoio ao palco principal e demonstrou-se o seu descontentamento: “Quero ensaiar a marcha popular e vocês estão a fazer muito barulho”. Os técnicos retorquiram – “Estamos a testar o som; é um concerto rock e esta situação é necessária”. Por sua vez, o tal senhor respondeu “Não me interessa. Vou já falar com a vereadora!”
Eu fiquei inicialmente espantado. Depois desenhou-se no meu rosto um sorriso ligeiro com o carácter caricato desta situação. E fiquei a pensar sobre o assunto…
Se tivéssemos de abdicar de uma das iniciativas – dada a intransigência das condições técnicas destes dois projectos – qual delas é que teria de “cair”? O que é que é mais válido e útil em termos de participação cultural? Quais são os hábitos sociais e culturais que devem ser promovidos? Ou então combatidos?
Um grafitti ou um mural partidário? Uma tarde a jogar playstation ou um serão a ver o “Domingo Desportivo”? Um filme porno na Internet ou ver o Big Brother? Uma “ganza” no Bairro Alto ou um copo de “três” no café da colectividade?
Eu sei que não sou a pessoa mais inteligente do Mundo… mas acho esta questão difícil de responder . Difícil e pertinente…
Uma boa percentagem da população em Portugal pensam que ser jovem é ser estúpido e preguiçoso; é ter um vocabulário limitado a palavras como “ya”, “naice” e “prontos”; ser jovem é usar as calças a cair, com as cuecas à mostra… é não saber nada sobre o que custa a vida!
Por vezes, sou obrigado a concordar com o último parágrafo – um concerto rock pode ser uma iniciativa cultural desinteressante e inútil. Eu até era capaz de dar razão ao senhor que ensaiava a sua marcha. Era capaz... mas não dou!
Não dou porque quem olha de fora recusa-se a compreender uma forma diferente de estar na vida, com novos hábitos sociais e culturais. O discurso “Antigamente sim... agora não...” é tão hermético e idiota que merecia um imposto. Mas por ser tão estúpida, esta forma de pensar tornou-se popular e assimilada inconscientemente pela maior parte das pessoas. Provavelmente, o caro leitor está neste momento “Mas isto foi e será sempre assim... há-de sempre haver um fosso geracional!” Porém caro leitor, a falta de referências numa sociedade consumista, onde o individualismo e a competividade são os únicos postulados éticos, devem fazer-nos pensar que temos que olhar para as gerações mais jovens com preocupação antes que o pior aconteça de novo... novamente... e mais uma vez...
Estou a ser pessimista? Não! As estatísticas defendem a minha perspectiva “negativa” e obrigam a sermos realistas e encararmos as dificuldades e encontrar novas soluções... com os jovens e pelos jovens...
Provavelmente, a Vida vai dar-me uma perspectiva diferente e vou arrepender-me destas palavras... mas até lá quero defender os “grafittis” e as “playstations” dos jovens inúteis deste País. Se eles são inúteis, os principais responsáveis desta situação são os políticos, os professores, os dirigentes associativos e os pais... mas a Culpa morre sempre solteira... com a sua virgindade intacta! É verdade que têm havido mudanças... mas muito lentas e insuficientes (... e não... eu não estou a exigir mais dinheiro para as associações juvenis...)
Eu não cheguei a saber se o tal senhor chegou a falar com a Vereadora – mas o ensaio de som continuou... e aposto que a marcha também...